À ESPERA DO TEMPO CVIII – QUAND...

À ESPERA DO TEMPO CVIII

 QUANDO O POVO NADA VALE 

 

Ives Gandra da Silva Martins

Presidente Emérito e decano da Academia Paulista de Letras

 

Meu bem, o povo aqui não vale nada,

Trezentos mil somente em 6 minutos

Os seus votos perderam na penada

De sete magistrados resolutos.

 

Querida, é bem difícil meu combate.

Num Brasil que não tem democracia,

Não há de nossa lei qualquer resgate

Rasgada, no poder, a todo dia.

 

Na voz, qu’inda me resta, nesta idade,

Eu grito, já sem forças, no meu peito

Para que o bem retorne de verdade

E tínhamos de novo o bom direito.

 

Eu luto, no meu sopro derradeiro,

Amando, minha pátria por inteiro.

 

20/05/2023

“A LENDA DOS QUATRO REINOS̶...

 

CANTO I

I

Era uma vez um país
Em que o povo bem feliz
Tinha príncipe e princesa,
Um rei bom com seus ministros,
Sem riscos e sem sinistros,
Governando com pureza.

II

Os seus cavaleiros nobres,
Ajudavam todos pobres
E defendiam seu reino,
A fome não existia
E todos em alegria
Do querer bem tinham treino.

III

Mas doutro lado do monte,
Com água da mesma fonte,
Havia um monarca mau.
Fazia sofrer o povo,
Sem criar nada de novo
Com seu modo tão brutal.

IV

Dois filhos tinha este rei
O rapaz amava a lei
E a moça boa justiça,
Amavam também seu pai
Mas almas de samurai,
Não tinham qualquer cobiça.

V

Era tempo dos dragões,
Dos castelos com porões,
Das armaduras e espadas,
As guerras com mil batalhas
Derrubaram as muralhas
Pelas terras conquistadas.

VI

O bom rei e o mau monarca
Sabiam que em uma escarpa,
A deusa Verdade estava,
Mas nem os dragões distantes
Descobriram os quadrantes,
Em que a Verdade era escrava.

VII

Os quatro reinos brasões
Dos dois reis e dos dragões
Mais aquele da Verdade,
Embora lá prisioneira,
Tinham a chama guerreira
Que gera animosidade.

VIII

E os príncipes e as princesas,
Sentiam muitas tristezas
Pelos reinos separados
E sonhavam ser um dia,
Unidos em harmonia,
Pela paz abençoados.

“A LENDA DOS QUATRO REINOS̶...

 

CANTO II

I

Do bom rei sua princesa,
De decantada beleza
Foi passear na floresta
E lá viu límpida fonte
Cuj’água embaixo da ponte
Ao cenário tudo empresta.

II

E decidiu, por beber,
Cansado todo seu ser,
O líquido cristalino,
Mais eis que surge uma fera,
Que a ponte já transpusera
Para ataque repentino.

III

Já quase estava por cima,
Quando num toque de esgrima,
A espada a feriu de morte,
Pois o filho do mau rei,
Um cavaleiro da lei,
Mudou da princesa a sorte.

IV

Falaram em vez primeira
Mas o amor seguiu na esteira
Da valentia do gesto.
Prometeram se casar
Mesmo tendo que enfrentar
Dos pais, por certo, o protesto.

V

Via o príncipe Adalberto
Sua amada bem de perto,
Quando se punha à janela.
Escondia-se na noite,
Mesmo com vento em açoite,
Pois adorava Anabela.

VI

Assim foi, por muitas vezes,
Passando dias e meses,
Neste idílio com passeios,
Seu amor era tão forte
Que não temiam a morte
E viviam sem receios.

VII

De Abelardo sua irmã
Ofertou-lhe um talismã
Para proteger o amor,
Também deu o próprio irmão
À Anabela um coração
Para mostrar seu calor.

VIII

Embora ninguém soubesse
Este amor quase uma prece
De dois jovens inocentes.
Estavam eles felizes
Apesar de seus países
Serem muito diferentes.

“A LENDA DOS QUATRO REINOS̶...

 

CANTO III

 

I

Os dois irmãos protetores,
Quando o sol pintava cores,
Encontraram-se, por fim,
O céu tisnado em azul
Mostrava o caminho sul
Para o mais belo jardim.

II

A princesa Catarina,
Com sorriso de menina,
Viu o príncipe encantado,
Apaixonou-se de pronto
E transformou o seu canto
Ao jovem Carlos chamado.

III

Carlos também viu a bela,
Tão linda quanto Anabela,
E apaixonou-se de vez.
Ficaram a sós os dois,
Deixando para depois
A concessão de mercês.

IV

Quando os quatro jovens nobres,
Sentando assentos de cobre,
Perceberam seu amor,
Pensaram como fazer
Nos pais desaparecer
O permanente rancor.

V

Queriam unir os reinos
Mas diplomatas sem treinos
Desconheciam caminhos,
Pois tendo um amor tão forte
Queriam mudar a sorte
Desta batalha de espinhos.

VI

Pensaram buscar dragões
Nos mais distantes rincões
Para trazerem a paz,
Pois os dragões, quando amigos,
Defendem-nos dos perigos
Que uma guerra sempre traz.

VII

E decidiram, portanto,
Escondidos no seu manto
Irem ao reino terceiro,
Procurar do rei dragão,
Co’a força do coração,
A força de cavaleiro.

VIII

E seguiram seus cavalos
Sem nada por ampará-los
Senão coragem e espadas,
Eis quando bate a paixão
Não há temor, não há não
Que desfaça tais cruzadas.

“A LENDA DOS QUATRO REINOS̶...

 

CANTO IV

I

Uma guarda dos dragões
Levou os quatro às prisões
Quando chegaram na terra,
O rei queria matá-los
Com os seus próprios cavalos
Pois pensava estar em guerra.

II

Pediram para falar
Os dois príncipes no altar,
Em que os dragões tem conselho
E apesar do seu tamanho
Não lhes parecer estranho,
Pois do poder era espelho.

III

Concedeu o rei dragão
Ouvi-los no seu salão,
Repleto de conselheiros.
Os quatro então lhe disseram
A razão porque vieram,
Sozinhos sem escudeiros.

IV

Queriam impor a paz
Que, de rigor, só se faz
Se a força se mostra justa,
Desejavam seu apoio
Formando um grande comboio
De dragões que ao povo assusta.

V

Contaram-lhe seu amor
E o desejo de repor
Entre os dois reinos concórdia,
Mas seus pais beligerantes
Tornaram os quatro infantes
Infelizes co’a discórdia.

VI

Comoveu—se o rei dragão
E prometeu-lhes ação,
Mais de ameaça que sangue
E os quatro muito felizes
Ficaram, pois seus países
Sentiam a gente exangue.

VII

E no tratado assinado
Ficou claro e combinado
Que os 3 reinos sempre em paz
Restariam, pois dragões
Têm melhores corações
Com escamas por detrás.

VIII

E voltaram aos castelos
Fortalecidos seus elos
De grandeza no futuro
Amavam-se os dois casais
Como amor igual jamais
Já se viu de tão seguro.

“A LENDA DOS QUATRO REINOS̶...

 

CANTO V

I

O bom rei,
como o rei mau,
Montavam seu arsenal
Para travar as batalhas,
Conquistar novas cidades,
Tirando-lhes liberdades,
Derrubando-lhes muralhas.

II

O bom rei jamais queria
Ingressar nesta porfia
Pelo rei mau provocado,
Mas entendeu, se vencesse,
Que ninguém mais esquecesse
A vitória conquistada.

III

O mau rei mostrava inveja
Não própria de quem almeja
Governar bem o seu povo,
Queria era conquistar
As terras para reinar
E ter um palácio novo.

IV

O bom rei de sua gente
Tinha apoio permanente
A defender seu reinado,
O mau rei impós à força,
Embora aos fatos distorça,
No combate desejado.

V

Um só queria a defesa,
Outro buscar com firmeza
Mais terras pro seu reinado
E a guerra assim preparada
Estava a ser iniciada
Com combates, lado a lado,

VI

Apesar de ambos os reis
Buscarem por sua vez,
Encontrar os quatro filhos,
Os quais desaparecidos,
Deixaram-nos ressentidos,
Tirando-lhes honra e brilhos,

VII

Mesmo assim pelas fronteiras
Tropas faziam fileiras
Para o combate iniciar.
Os dois reis, em seus cavalos,
Com seus súditos a olhá-los,
Estavam p’ra levantar

VIII

As espadas e seus gritos,
Que desde os tempos finitos
Seguem combates e guerras,
Foi quando viram chegar
Seus filhos a cavalgar
E mil dragões de outras terras.

“A LENDA DOS QUATRO REINOS̶...

 

CANTO VI

I

Os dois reis ficaram mudos,
Baixaram os seus escudos,
Pararam seus esquadrões,
As espadas mais as flechas
Não descobriram as brechas
Nas escamas dos dragões.

II

O bom Carlos e Adalberto
Entraram no campo aberto
Entre os guerreiros dos dois
E depuseram espadas,
Nos braços tendo as amadas,
Que lhes chegaram depois.

III

O rei dragão veio perto
Abrindo imenso deserto
Com suas asas no campo,
Todos pararam na ação,
Sem que houvesse proteção,
Nem contra o vento algum tampo.

IV

Aos dois reis falou então
Este enorme rei dragão
Desejar vê-los em paz,
Queria ter dos dois reis
Apoio forte, talvez
Ao reino que está detrás.

V

Contou-lhes que a liberdade
Só teriam se a Verdade
Fosse afinal libertada,
No seu reino bem distante
Por onde enorme gigante
A mantinha aprisionada.

VI

Colocou os seus dragões
Com os dos reis guardiões
Pra combater os soldados
Do gigante da mentira
Que contra o mundo conspira,
Protegendo os maus costados.

VII

E que se aquele reinado
Fosse por fim libertado
Renasceria a Verdade,
Com a sua formosura
De beleza mais que pura
Por nascer da eternidade.

VIII

E a paz então reinaria
Para o povo em alegria
Nos quatro reinos distintos.
O bom rei daria o tom
E o mau rei seria bom,
Ficando os males extintos.

“A LENDA DOS QUATRO REINOS̶...

 

CANTO VII

I

Concordes os três monarcas
Partiram atrás das areas
Onde a Verdade era escrava.
Os dois príncipes à frente,
Mostravam que ser valente
É próprio de gente brava.

II

Foram os três reis e os dois,
Não deixaram p’ra depois Libertar esta rainha,
Cujo mistério é segredo,
Porém que elimina o medo
A quem p’ra luta caminha.

III

O gigante e sua tropa
Vendo a gente que galopa,
Com gritos ao seu encontro,
De pavor acovardou-se,
Tendo a Verdade täo doce
Com o bem seu reencontro.

IV

Fugiu pra sempre o gigante
E não mais um viajante
Dele e os seus ouviu falar,
Dizem que, ao deixar os arcos,
Embarcou em muitos barcos
E foi muito além do mar.

V
A Verdade disse então
Aos três reis que a salvação
Dar-lhes-ia recompensa,
Ensinaria a bondade,
Como igual jamais se há-de
Conhecer assim tão densa.

VI

Os três reis no coração,
Os dois reis mais o dragão
Receberam da Verdade
A força pro bem do povo,
Pois não há nada mais novo
Que nela ter liberdade.

VII

E os três reinos inimigos
Tornaram-se então amigos,
Pois descobriram que os reis
Só são bem reis de verdade
Se para a comunidade,
Servirem, sendo fiéis.

VIII

E a gente muito feliz,
Cada povo em seu país,
Encontraram seu atalho,
Pois a Verdade ensinara,
Que vale mais a seara
Sem guerra e só com trabalho.

“A LENDA DOS QUATRO REINOS̶...

 

CANTO VIII

I

E a lenda termina aqui Vale a pena o que escrevi
Para os meus valentes netos.
São sete muito queridos, Por mim jamais esquecidos, Seguindo caminhos retos.

II

Esqueci-me de dizer
O que veio acontecer
Com aqueles dois casais,
Visto que sem seu amor
Não haveria o valor
A colocar nos anais.

III

Foram festas memoráveis,
Seus casamentos estáveis
Permaneceram no tempo.
Dos dragões foram amigos,
Protetores nos perigos,
Com asas, gerando vento.

IV

Um casal teve um menino
Que teve um belo destino
Loiro tendo a cabeleira
E o outro teve seis filhos
Que seguiram pelos trilhos
Em sua virtude inteira.

V

E os quatro reinos assim,
Todos tendo seu jardim,
Foram felizes e o povo
Descobriu que o bom governo
Serve mais quando fraterno,
Cria esperança de novo.

VI

Assim se todo o Universo
Coubesse neste meu verso
Uma lição deixaria,
Que mais governa quem serve,
Pois essa se torna verve
Que gera sempre alegria.

VII

Espero que um dia o mundo
Tenha um governo profundo
Com a força dos dragões,
Ancorados na Verdade,
Vivendo na liberdade,
Repletos os corações.

VIII

Quero assim, meus caros netos,
Que seguem caminhos retos,
Ainda em fase de treinos,
Que pensem que vale a pena
Viver na vida terrena
A lenda dos quatro reinos.

Jaguariúna 05 a 07/07/2014.